Histórico

A ideia do projeto “Salvador Vai de Cafezinho – Programa de Mobilização Social na Perspectiva da Salvaguarda dos Carrinhos de Café” nasceu nas rodas de bate-papo do projeto “Patrimônio É”, sobre patrimônio cultural material e imaterial da cidade de Salvador, promovidas pela Diretoria do Patrimônio, da Fundação Gregório de Matos. Em 2020, Edvard Passos mediou a mesa “Carrinho de Café: Patrimônio em Movimento”, com a participação do fotógrafo Roberto Faria e do museólogo Eduardo Fróes.

Inspirado por esta experiência, Edvard Passos, que é diretor artístico do projeto, diretor teatral, mas também arquiteto, decidiu revitalizar a ideia dos concursos de carrinho de café de Salvador, incrementando o projeto com outras ações, em benefício dos “cafezinhos”.

Para além disso, o realizador do projeto acredita que a cultura popular é um tesouro incalculável, especialmente numa cidade como Salvador, que sintetizou muitas experiências humanas vindas de toda parte do mundo. Edvard Passos é um artista que se declara muito motivado pelas criações do povo, como demonstram os projetos que já realizou no teatro dedicados à obra de Jorge Amado, ao carnaval, à Raul Seixas, ao Esporte Clube Bahia e ao poeta Castro Alves.

“O carrinho de café sempre foi uma verdadeira paixão para mim. São fascinantes, hipnotizantes, tri-eletrizados, ambulantes. Eles são transformadores da paisagem da cidade, com muita irreverência, criatividade e ludicidade. É como um brinquedo, que é também instrumento de trabalho, artefato muito inventivo, com possibilidades performáticas imensas. Ele diz muito sobre nós.

O carrinho de café é resistência, a materialização da inteligência e inventividade na luta contra opressão e pela sobrevivência. Eles são herdeiros de uma linhagem estética popular barroca da Cidade da Bahia, são primos das barracas de festa de largo, netos dos saveiros, sobrinhos dos trios elétricos.  Essa rica ambiguidade, esse design em prol de um trabalho que seja, ao menos, um pouco menos extenuante e mais prazeroso… Não é à toa que foi surgir justo em Salvador”, conclui Edvard.

Registro de Ofício / Importância social e cultural – A revitalização do concurso é um importante passo no fomento da atividade e reconhecimento oficial por parte do município do carrinho de café como patrimônio cultural da cidade de Salvador. Originalmente realizado no final da década de 80 e durante a década de 90, esta retomada é uma importante ação nas linhas de formação, memória e fruição e apoia a permanência do bem cultural, compartilha saberes de seus artífices e ocupa o espaço público da cidade com uma atividade lúdica, que valoriza a cultura popular e celebra o aniversário da nossa cidade.

A cultura do carrinho de café é uma expressão genuinamente soteropolitana. Eduardo Fróes, museólogo e autor da importante dissertação Um patrimônio em movimento: os carrinhos de café nas ruas de Salvador (UFBA, 2018), afirma que nenhuma outra cidade foi capaz de produzir semelhante artefato. Os famosos carrinhos comunicam e equilibram alegria e labor com muita habilidade e carisma e, por isso, conquistam facilmente espaço no coração e na apreciação das pessoas.

O carrinho de café é um patrimônio cultural identitário da cidade de Salvador, mas que carece de reconhecimento e espaço digno na memória. O carrinho revela a habilidade de nossa população em encontrar estratégias de sobrevivência que aliam melhores condições de trabalho, à ludicidade e a alegria. O fotógrafo Roberto Faria afirma que a linguagem visual dos carrinhos de café de Salvador guarda valioso legado da expressão colorida das barracas de festas de rua. É um dos últimos artefatos remanescentes de uma típica visualidade, criatividade, singeleza e irreverência de uma determinada cidade da Bahia.

Hoje, o carrinho de café soteropolitano sofre a ameaça de ser substituído por outro carrinho industrializado que cada vez mais domina o mercado e está ameaçado de ser extinto da paisagem soteropolitana, como aconteceu com as típicas barracas de festa de largo e os saveiros. Eduardo Fróes lembra que nenhum museu da cultura popular abriga em seu acervo a memória do carrinho de café.